A controvérsia se instalou porque, embora o fabricante tenha obtido o registro do produto junto ao Ministério da Agricultura, Agropecuária e Abastecimento (MAPA), a Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luis Roessler (Fepam) negou o cadastramento do agrotóxico, impedindo assim a sua comercialização em território gaúcho. A empresa então impetrou mandado de segurança, no qual alegou seu direito líquido e certo de vender o agrotóxico no estado, sustentando ainda que teria havido invasão da competência da União por um estado-membro. Reiterou que o agrotóxico está registrado e é comercializado em 84 países, inclusive nos maiores mercados agrícolas, e não foi banido da União Europeia por questões de saúde, mas por uma questão processual.
A liminar foi negada em primeira instância, sob o argumento de que, a despeito de haver registro no Ministério da Agricultura, o fabricante não fica desobrigado de atender à legislação estadual para obtenção de autorização para distribuição e comercialização deste tipo de produto no Rio Grande do Sul. No entanto, ao julgar recurso contra esta decisão, o TJ-RS concedeu liminar para permitir a comercialização. Foi esta a decisão suspensa pela ministra Cármen Lúcia.
No pedido feito ao STF, a fundação pública gaúcha apontou os riscos resultantes da decisão do TJ-RS para a saúde pública, salientando que o ingrediente ativo do agrotóxico (paraquate) tem alta toxidade e pode desencadear no trabalhador rural que o manipula mutagenicidade e doença de Parkinson, e danos para o meio ambiente, em especial aos mamíferos leporídeos e aos ovos de aves. Ressaltou que não há antídoto no caso de intoxicação aguda causada pela exposição dos agricultores ao produto. Não há evidência, no entanto, de que o uso do agrotóxico deixe resíduos em alimentos. A fundação acrescentou que, em 19 de setembro do ano passado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) deliberou pelo banimento do paraquate a partir de 2020, estabelecendo, até lá, procedimento de transição sobre as culturas específicas nas quais o produto pode ser utilizado, tornando obrigatória a assinatura do termo de responsabilidade e esclarecimentos sobre o risco de uso do herbicida. Informou ainda que o herbicida não possui registro em nenhum país-membro da União Europeia.
Decisão
A ministra Cármen Lúcia observou que a discussão em análise se assemelha à da proibição do amianto. “O reconhecimento pelo órgão federal do prejuízo no uso do paraquate à saúde daqueles que manipulam herbicidas com essa substância em sua composição demonstra a similaridade da questão jurídica posta na espécie vertente com aquele objeto das ações de controle abstrato de constitucionalidade ajuizadas contra leis estaduais pelas quais se proibiu a produção, comercialização e uso de amianto/asbesto, nas quais este Supremo Tribunal assentou a legitimidade constitucional da opção legislativa estadual em editar normas específicas mais restritivas que a lei nacional, na esfera de sua competência legislativa concorrente, suplementar (sobre comércio, consumo e meio ambiente) e comum (cuidar da saúde), não havendo impedimento em adotar providência mais cautelosa que a estabelecida pelo legislador nacional”, afirmou.
A ministra acrescentou que, a despeito da discussão sobre a competência legislativa dos estados sobre a matéria, é inegável que a atuação do órgão de licenciamento estadual aperfeiçoa o processo de garantia de afastamento de perigo à saúde e de risco ao meio ambiente, configurando medida de prevenção para segurança das gerações futuras, com efetiva proteção e respeito à saúde e à integridade física. “Pelo princípio da prevenção, acautela-se contra danos possíveis de serem previstos. Pelo princípio da precaução, previnem-se contra riscos de danos que não se tem certeza que não vão ocorrer”, concluiu.
VP/AD
Fonte: STF
Nenhum comentário:
Postar um comentário